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Jorge Cesar de Assis

Os novos desembargadores da Justiça Militar

O Conselho Nacional de Justiça – CNJ, quando do recente julgamento de pedido de providências[1] inaugurado pelo magistrado Paulo Roberto Mendes Rodrigues, que na qualidade de Presidente do Tribunal de Justiça Militar do Estado do Rio Grande do Sul requeria a edição de ato normativo para autorizar a padronização do título “Desembargador” aos Tribunais de Justiça Militar dos Estados, dando-lhe assim tratamento isonômico aos demais tribunais brasileiros, julgou parcialmente procedente o pedido, ou seja, ao tempo em que entendeu não ser atribuição do CNJ editar regramento específico para regulamentar nomenclatura a ser utilizada na Justiça Militar, afirmou a possibilidade de edição de ato interno para tratar da temática veiculada – nomenclatura de seus membros como Desembargadores – pela própria Justiça Militar, a exemplo do que já fizeram órgãos da Justiça Federal (TRF1, TRF2, TRF3, TRF4 e TRF5) e Justiça Trabalhista (CSJT) nacionais.


A decisão ficou assim ementada: EMENTA. PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS. JUSTIÇA MILITAR DOS ESTADOS. DENOMINAÇÃO DE JUÍZES MILITARES DE SEGUNDA INSTÂNCIA COMO “DESEMBARGADORES”. POSSIBILIDADE DE REGULAMENTAÇÃO POR ATO PRÓPRIO DOS TRIBUNAIS CASTRENSES. PEDIDO JULGADO PARCIALMENTE PROCEDENTE.


Com isso, autorizou que os tribunais militares dos Estados de Minas Gerais, Rio Grande do Sul e São Paulo, possam alterar a nomenclatura hoje existente de seus membros (Juiz do Tribunal de Justiça Militar) para aquela pretendida, isonômica com os demais tribunais de segundo grau, qual seja a de Desembargador da Justiça Militar.


É de se aplaudir a mudança de nomenclatura autorizada por ato interno de cada tribunal.


Em primeiro lugar porque ela já existe de fato, por ato interno dos demais tribunais como apontado na decisão do pedido de providências, citando a edição da Resolução nº 58, de 06.08.2009, do Tribunal Regional do Trabalho da 13ª Região (TRT13), em cujo art. 3º procedeu a alteração similar à pretendida pela Egrégia Justiça Militar, verbis: “(...) Art. 3º A denominação dos Membros deste Tribunal passa a ser Desembargador Federal do Trabalho”. No mesmo sentido a Resolução nº 104/2012[2], do Conselho Superior da Justiça do Trabalho – CSJT, que considerou que a utilização do título de Desembargador ostenta caráter informativo e esclarecedor para o jurisdicionado e público em geral quanto ao exercício da jurisdição de 2º grau, e já no seu art. 1º assevera que “os vocábulos de tratamento dos magistrados de 1º e 2ª instância na Justiça do Trabalho são uniformizados em “Juiz do Trabalho Substituto”, “juiz titular de Vara do Trabalho” e “Desembargador do Trabalho”, determinando no artigo seguinte que os Tribunais Regionais do Trabalho providenciassem a substituição das expressões divergentes porventura constantes de seus Regimentos Internos e demais atos pelas denominações definidas por aquela Resolução.


Por sua vez, os Regimentos Internos dos cinco tribunais regionais federais, da mesma forma, já procederam à referida substituição de nomenclatura, v.g., TRF 1 (art. 1º); TRF2 (art. 1º); TRF3 (art. 1º); TRF4 (art. 2º) e; TRF5 (art. 1º), nominando seus integrantes de Desembargadores Federais.


Apontou o requerente do Pedido de Providências que no Estado do Rio Grande do Sul, os Juízes do Tribunal de Justiça Militar eram igualados aos Juízes do Tribunal de Alçada[3], e que a Lei gaúcha nº 11.133/98 determinou o fim do Tribunal de Alçada elevando seus membros ao cargo de Desembargador do Tribunal de Justiça, porém, à época, não foi modificada a nomenclatura dos juízes de 2º grau da Justiça Militar do Rio Grande do Sul.


Lembrou René Dotti, em artigo publicado no jornal “O Estado do Paraná”, caderno “Direito e Justiça”, de 05.01.2003, que os Tribunais de Alçada foram inicialmente previstos na Constituição de 18.12.1946 (art. 124, II). O primeiro a ser criado foi o de São Paulo (Lei n.º 1.162, de 31.7.1951). O aumento da carga de processos obrigou o desdobramento e a criação do 1.º e 2.º Tribunais de Alçada Civil e do Tribunal de Alçada Criminal.


E que, a alçada, entendida sinteticamente como o limite à jurisdição, era o poder deferido aos órgãos judiciários coletivos de decidir pedidos até certo valor em dinheiro ou determinados crimes e contravenções. Esse critério de distribuição teve origem no Livro I, Título 25 das Ordenações Afonsinas, como lembra Pontes de Miranda em seus Comentários à Constituição de 1946.


Mas a descentralização de serviços judicantes prevista naquela Carta apenas se materializou em cinco unidades federativas. Com as unificações ocorridas no Rio de Janeiro e no Rio Grande do Sul, restaram apenas São Paulo, Minas Gerais e o Paraná[4].


Foi a Emenda Constitucional 45, de 2004 que aprovou a fusão dos Tribunais de Alçada com os de Justiça, unificando novamente a competência até então dividida. Da mesma forma, a EC 45/2004, ampliou, consideravelmente a competência da Justiça Militar Estadual, conferindo-lhe jurisdição cível, fundada no processo e julgamento das ações judiciais contra atos disciplinares militares e, desta forma, abandonou o critério limitador de competência que era caracterizador da referida “alçada”. Não custa lembrar que a edição da Lei nº 13.491/2017, que alterou o inciso II, do art. 9º, do Código Penal Militar, e de consequência aumentando o rol dos crimes militares com o advento dos chamados crimes militares por extensão, implicou no natural aumento da própria competência da Justiça Militar.


E, em segundo lugar, porque não se pode negar que a mantença da nomenclatura Juiz do Tribunal de Justiça Militar (como assim eram chamados os Juízes do Tribunal de Alçada) fomenta, inclusive, uma injustificável discriminação em relação a esses magistrados que são partes integrantes da Estrutura do Poder Judiciário brasileiro (CF, art.92, VI).


Tendo os Tribunais de Alçada (aos quais os Tribunais de Justiça Militar estaduais eram equiparados) sido incorporados aos Tribunais de Justiça, e os antigos Juízes do Tribunais de Alçada naturalmente passarem a ser denominados de “Desembargadores”, deixou de existir razão para que os magistrados de segunda instância da Justiça Militar Estadual continuem a ser denominados de Juízes do Tribunal de Justiça Militar.


Ademais, a EC 45/2004, aperfeiçoando a Justiça Militar Estadual, alterou a redação do § 3º do art. 125 da Carta Magna, passando a prever, expressamente a figura do Juiz de Direito como órgão judicial independente, ao lado dos Conselhos de Justiça, que o magistrado togado também integra, mas agora, na qualidade de seu Presidente, situação que, até então era deferida ao Oficial militar de maior posto ou antiguidade (CF, art. 125, § 5º).


Esta tendência de aperfeiçoamento da Justiça Militar brasileira, também ocorre na Justiça Militar da União (CF, artigos 122- 124), inclusive no tocante à nomenclatura de seus magistrados de primeira instância, os quais, com o advento da Lei 13.774, de 19.12.2018[5], alterando a designação do magistrado togado para Juiz Federal da Justiça Militar, mais consentâneo com o tratamento dado aos magistrados da Justiça Federal, uma vez que o termo “Auditor” provém da legislação mais antiga. Da mesma forma, os integrantes do Superior Tribunal Militar (que é um Tribunal Superior e órgão de segunda instância da Justiça Militar da União) são denominados de “Ministros “e sempre detiveram a nomenclatura à semelhança dos membros do Supremo Tribunal Federal e dos demais Tribunais Superiores.


Concluindo, podemos afirmar que a Justiça Militar brasileira caminha a passos firmes para o aperfeiçoamento de seus órgãos e de consequência da melhoria da sua prestação jurisdicional. A mudança de nomenclatura dos Juízes dos Tribunais de Justiça Militar para Desembargadores da Justiça Militar, agora autorizada pelo Conselho Nacional de justiça, é consentânea com a de seus pares, que atuam nos diversos tribunais de outros ramos da Justiça brasileira. Cabe agora, por Ato Interno, aos Tribunais de Justiça Militar de Minas Gerais, Rio Grande do Sul e São Paulo, efetivar a salutar medida.



Jorge Cesar de Assis é Advogado, Presidente da Comissão de Direito Militar da OAB-PR. Promotor aposentado da Justiça Militar da União. Integrou o Ministério Público paranaense. Oficial da Reserva Remunerada da Polícia Militar do Paraná. Coordenador da Biblioteca de Estudos de Direito Militar da Editora Juruá. Secretário Geral da Associação Internacional das Justiças Militares – AIJM. Membro correspondente da Academia Mineira de Direito Militar.

NOTAS


[1] CNJ, PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS nº 002541-69.2019.2.00.0000, relator o Conselheiro Valdetário Andrade Monteiro, julgado em 06.06.2019.


[2] Disponibilizada no JeJT de 28.05.2012.


[3] A Emenda Constitucional nº 45/2004, promulgada em 8 de dezembro de 2004, entrou em vigor no dia 31 de dezembro do mesmo ano. Com ela, foram extintos os Tribunais de Alçada, “ex vi” do “caput” do seu art. 4º, “verbis”: “Ficam extintos os tribunais de Alçada, onde houver, passando os seus membros a integrar os Tribunais de Justiça dos respectivos Estados, respeitadas a antiguidade e classe de origem”.


[4] DOTTI, René. A extinção do Tribunal de Alçada. Disponível em https://dotti.adv.br/a-extincao-do-tribunal-de-alcada/ acesso em 15.06.2019.


[5] Que altera a Lei nº 8.457, de 4 de setembro de 1992, que “Organiza a Justiça Militar da União e regula o funcionamento de seus Serviços Auxiliares”.


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