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Jorge Cesar de Assis

Casamento entre sogro e nora e a fraude previdenciária na habilitação da pensão militar

Não é demasia citar Platão, quanto à verdade: “É preciso tender para a verdade, com toda a alma, com o coração e a inteligência”. (Min. Marco Aurélio, STF, MS 29.310-BA)

 

 

         Contextualizando os fatos

           

Na primeira metade de agosto de 2024, a comunidade jurídica foi surpreendida por duas decisões do Superior Tribunal Militar (STM) em face da ocorrência de fraude previdenciária, das quais decorreu a condenação dos envolvidos.


Segundo noticiado pelo próprio tribunal em data de 14 de agosto, no primeiro julgamento[1], o STM manteve a condenação de uma mulher e do ex-companheiro dela por fraude contra o sistema de pensão do Exército Brasileiro. A mulher, 40 anos mais nova, casou-se em cartório com um ex-combatente da Força Expedicionária, na época com 89 anos, na cidade de Recife (PE). O idoso, que era sogro da acusada, tinha Alzheimer e morreu poucos meses após o casamento. Após a morte, a mulher passou a receber a pensão por quase 10 anos, até ser denunciada por uma das netas do idoso, que alegou que a mulher havia armado o casamento para burlar o sistema de pensão e induzir o Exército Brasileiro ao erro[2]. Na sentença de primeiro grau ocorreu condenação pelo art. 251 do CPM - Estelionato.


Já o segundo caso[3], noticiado em 15 de agosto e relativo ao segundo julgamento[4], envolveu uma nora que se casou com seu sogro para herdar a pensão militar. Ela teria ficado 18 anos enganando a administração pública, causando prejuízos que somaram mais de R$ 5 milhões. Conforme informado, a denúncia foi oferecida em 4 de abril de 2022 pelo Ministério Público Militar à Justiça Militar da União, em Porto Alegre (RS), e narra que a ré, hoje com mais de 60 anos, contraiu matrimônio em outubro de 2002, firmado em cartório, com um major aposentado do Exército. Na época, ela tinha 37 anos, e o idoso, 80. O aposentado era seu sogro e avô de seu filho. Ainda segundo a promotoria, o único intuito das núpcias era a obtenção da pensão pela morte iminente do militar reformado, que já estava em estágio avançado de câncer de próstata. Exatamente um ano após o casamento, em 30 de outubro de 2003, o aposentado faleceu. No mês seguinte, ela foi ao Comando do Exército, se apresentou como viúva e requereu a pensão militar deixada pelo major. Dali em diante, passou a receber mensalmente dos cofres públicos os valores integrais da pensão. “Após 15 anos mantendo a administração militar em erro, em 2018, sobreveio notícia do fato ao Ministério Público, comunicando que ela fora casada com o filho do major, também falecido, em junho de 1999, cerca de três anos antes de se casar com seu ex-sogro”, informou a promotoria na denúncia. Em primeiro grau ocorreu absolvição por se considerar válida a certidão de casamento apresentada para habilitação à pensão.


Em ambos os casos, o dispositivo penal apontado como violado foi o art. 251, caput, do Código Penal Militar[5] que tipifica o estelionato. Nos dois julgamentos a decisão foi por maioria, sendo vencido o Min. Artur Vidigal de Oliveira que apresentou voto divergente no primeiro caso e foi o relator do segundo, entendendo não haver crime porque a certidão de casamento apresentada perante a Administração Militar para a habilitação à pensão militar era verdadeira e apta a gerar o efeito pretendido.


A análise das duas decisões enseja verificar se o casamento civil realizado entre os sogros militares reformados[6] com as respectivas noras foi válido ou não e, se realmente ocorreu o estelionato que serviu de fundamento para as condenações.

 

Da validade do casamento perante a lei civil


Existe no Livro IV (Do Direito de Família) do Código Civil um capítulo específico tratando do casamento (Título I, Subtítulo I). Quanto ao momento da consumação, dispõe o art. 1.514 do Código Civil, que o casamento se realiza no momento em que o homem e a mulher manifestam, perante o juiz, a sua vontade de estabelecer vínculo conjugal, e o juiz os declara casados.


Dentre os impedimentos previstos pela lei, estabelece o art. 1.521, inciso II que não podem casar os afins em linha reta, sendo que, nos termos do art. 1.522, os impedimentos podem ser opostos, até o momento da celebração do casamento, por qualquer pessoa capaz, estabelecendo seu parágrafo único que, se o juiz, ou o oficial de registro, tiver conhecimento da existência de algum impedimento, será obrigado a declará-lo.


O Código cuidou também daquilo que considera prova do casamento celebrado no Brasil, que é a certidão de registro (art. 1.541).


Quanto à invalidade do casamento dispõe o art. 1.548 do Código Civil que é nulo o casamento contraído por (...) II – infringência de impedimento[7].


O inciso I do art. 1.548, com sua redação original previa ser nulo o casamento contraído pelo enfermo mental sem o necessário discernimento para os atos da vida civil. Tal inciso foi revogado pela Lei 13.146, de 2015, mas, ante o princípio do tempus regit actum, poderia incidir nos casos anteriores à sua revogação. Já o art. 1.549 do Código Civil, assevera que a decretação de nulidade de casamento, pelos motivos previstos no artigo antecedente, pode ser promovida mediante ação direta, por qualquer interessado, ou pelo Ministério Público, mas é claro, não seria a Justiça Militar da União a competente para decretar a nulidade de qualquer casamento, podendo reconhece-la, entretanto, no caso concreto.


Lembremos que é anulável o casamento do incapaz de consentir ou manifestar, de modo inequívoco, o consentimento (CC, art.1550, IV).


Há que se considerar que, conforme o art. 1.560, o prazo para ser intentada a ação de anulação do casamento, a contar da data da celebração, é de: I - cento e oitenta dias, no caso do inciso IV do art. 1.550 (do incapaz de consentir ou manifestar, de modo inequívoco, o consentimento); II - dois anos, se incompetente a autoridade celebrante; III - três anos, nos casos dos incisos I a IV do art. 1.557 (erro essencial sobre a pessoa do outro cônjuge); IV - quatro anos, se houver coação.


Observe-se, no entanto, que nulo é diferente de anulável, se o casamento é nulo não é necessária nenhuma ação para anulá-lo, mas sim para declarar aquela nulidade que está concentrada no próprio ato celebrador do matrimônio. Nos termos do art. 166, VII, do Código Civil, é nulo o negócio jurídico quando a lei taxativamente o declarar nulo [art. 1.521, II c/c art. 1.548, II], ou proibir-lhe a prática, sem cominar sanção. Sintetizando:  A nulidade sempre é vício ou defeito mais grave, que pode ser levantado por qualquer interessado, a qualquer tempo [não há prescrição] e é insanável [o ato não pode ser corrigido ou convalidado].


Sendo nulo o casamento, vale lembrar que de acordo com o art. 1.571, inciso II, do Código Civil, a sociedade conjugal termina pela nulidade ou anulação do casamento, o que somente pode ser decretado em face de uma sentença judicial, necessariamente averbada em Registro Público, em obediência ao art. 10 do Código: Far-se-á averbação em registro público: I - das sentenças que decretarem a nulidade ou anulação do casamento, o divórcio, a separação judicial e o restabelecimento da sociedade conjugal.

 

Das condições de saúde do nubente varão por ocasião do casamento


Nos dois casos julgados pelo STM era considerável a diferença de idade entre os nubentes, aliado ao fato de que os mais velhos, militares reformados, estavam em condições precárias de saúde.

Como dito linhas atrás, no primeiro caso, o militar do Exército era portador de Alzheimer e, no segundo, câncer da próstata em estágio avançado.


Principalmente em relação ao primeiro caso, sabe-se que o Alzheimer é o tipo mais comum de demência no mundo, representando entre 60 e 80% dos casos diagnósticos. 


É um quadro neurodegenerativo progressivo caracterizado pela morte de neurônios que atuam no funcionamento da memória e das funções executivas do cérebro.  


Por isso, a doença afeta as funções cerebrais consideradas “nobres” como memória, comportamento, controle emocional, linguagem, atenção e capacidade de planejamento, entre outras.  


Assim, os indivíduos que convivem com a doença passam a ter dificuldades para desempenhar funções diárias comuns como autocuidado, continência e alimentação.  


A evolução da doença ocorre em três fases, desde o estágio inicial - com menor dependência - até avançado, quando a falta de autonomia é completa[8] e, em princípio seria facilmente detectável pela autoridade, principalmente em um ato solene como o matrimônio.  


Já o câncer de próstata, em que pese a malignidade e dos graves sintomas, não tem por regra efeitos relacionados à diminuição da capacidade mental do paciente.


Para além dos problemas de saúde dos militares idosos e da enorme diferença de idade, seria possível perscrutar acerca até mesmo da capacidade deles em consentir ou manifestar, de modo inequívoco, o consentimento. Mas tal reflexão é desnecessária visto que a responsabilidade penal pela eventual participação ativa dos militares inativos na fraude previdenciária estaria afastada pela extinção da punibilidade em decorrência da morte do agente (CPM, art. 123, I).


Desta forma, parece facilmente demonstrável que o casamento dos dois sogros com as duas noras padecia do impedimento apontado no inciso II, do art. 1.521, do Código Civil (eram afins em linha reta). Com efeito, nos termos do art. 1.594, do Código Civil, contam-se, na linha reta, os graus de parentesco pelo número de gerações, e, na colateral, também pelo número delas, subindo de um dos parentes até ao ascendente comum, e descendo até encontrar o outro parente. Já o art. 1.595 determina que cada cônjuge ou companheiro é aliado aos parentes do outro pelo vínculo da afinidade, prevendo por fim o § 1º, que o parentesco por afinidade se limita aos ascendentes, aos descendentes e aos irmãos do cônjuge ou companheiro e, conforme o § 2º, na linha reta, a afinidade não se extingue com a dissolução do casamento ou da união estável. Ou seja, sogro e nora ou ex-sogro e ex-nora estarão sempre impedidos de casar.


Em que pese não ter sido apontado o impedimento da afinidade no momento oportuno, nem tendo sido intentada qualquer ação visando declarar a nulidade do casamento esta não se convalida, podendo ser reconhecida a qualquer tempo.

 

Competência para decretar a nulidade do casamento

 

Costumamos dizer que a Justiça Militar brasileira possui um caráter sui generis, já que se revela um gênero com duas espécies, a Justiça Militar da União, prevista entre os arts. 122 a 124 da Constituição Federal e, a Justiça Militar Estadual, prevista no art. 125, §§ 3º, 4º e 5º. Enquanto a Justiça Militar da União possui uma competência ampla, pois ao processar e julgar os crimes militares definidos em lei submete à sua jurisdição qualquer pessoa, inclusive os civis, a Justiça Militar Estadual tem competência restrita, pois processa e julga os crimes militares definidos em lei e que sejam cometidos pelos militares estaduais e do Distrito Federal[9]. Anote-se, ainda, ser de competência da Justiça Militar Estadual, processar e julgar as ações judiciais contra atos disciplinares militares.

           

Conquanto não seja a Justiça Militar a competente para decretar nulidade de casamento, nada impede que ela reconheça o casamento nulo como artifício para fraudar o sistema de concessão de pensão militar nas Forças Armadas, quando existente um nexo causal para a figura do estelionato, previsto no art. 251, caput, do Código Penal Militar.

 

Do estelionato


Convém agora, verificar se está presente a figura do estelionato, no casamento de militar idoso com sua nora ou ex–nora, despicienda esta diferenciação temporal porque a afinidade não se extingue com o fim do casamento que lhe deu origem. 


Conforme já anotamos alhures, caracteriza-se o estelionato pela presença de seus elementos constitutivos, a saber: o artifício fraudulento; o induzimento por meio dele, das vítimas em erro; o prejuízo por estas sofrido; o correspondente locupletamento ilícito dos agentes e o dolo[10].


Lembram Roberto Carvalho Veloso e Dhiego Melo Job de Almeida, em substancioso artigo publicado na Revista Pensamento Jurídico, referindo-se às condutas criminosas que têm como objeto benefícios previdenciários e assistenciais normalmente subsumem-se ao tipo penal previsto no art. 171, § 3º, do Código Penal (CP), denominado estelionato majorado ou circunstanciado[11] – mas com plena pertinência aos julgados da Justiça Militar[12]. As entidades de Direito Público, explicam, são os entes federativos (União, Estados, Municípios e Distrito Federal), e prosseguem afirmando que, quando o objeto do delito são benefícios previdenciários dos Regimes Próprios da Previdência Social (RPPS) dos entes federativos e do Regime Complementar de natureza pública dos servidores públicos , a majorante também incide, pois o ente federativo (União, Estados, Municípios e Distrito Federal) [e dizemos nós, a Administração Militar] será sujeito passivo da conduta criminosa, chamada de estelionato previdenciário.


Os autores lembraram ainda que em alguns julgados, os Tribunais Superiores denominam “estelionato de rendas” o crime de estelionato que tem como objeto prestações pecuniárias sucessivas a determinado beneficiário, cujo pagamento é renovado a cada mês (HC 12.914/SC, Rel. Ministro JOSÉ ARNALDO DA FONSECA, Quinta Turma, julgado em 15/06/2000, DJ 07/08/2000, p. 125); também que O STF possui posicionamento pacífico de que o crime praticado pelo beneficiário de prestação previdenciária e assistencial é de natureza permanente, enquanto que para o terceiro trata-se de crime instantâneo de efeitos permanentes (ARE 663735 AgR, Relator(a): Min. AYRES BRITTO, Segunda Turma, julgado em 07/02/2012, Acórdão Eletrônico, DJe-056 divulgado em 16-03-2012, publicado em 19-03-2012); e que no STJ, havia divergência entre a Quinta Turma, que entendia que para o beneficiário tratava-se de crime permanente, e a Sexta Turma, que julgava pela natureza de crime instantâneo de efeitos permanentes. A divergência foi resolvida na Questão Ordem da Terceira Seção no Resp. 1206.105/RJ, conforme noticiado no Informativo nº. 0500[13].


Essas considerações são aproveitadas para a análise da prescrição do estelionato previsto no art. 251, do Código Penal Militar – que tem uma pena máxima de 07 anos, e cuja prescrição se opera em 12 anos [CPM art. 123, IV]. Para as acusadas beneficiárias da pensão militar a contagem do prazo prescricional só se inicia com a cessação do benefício previdenciário ou assistencial, enquanto que para o terceiro que colaborou com a fraude, como se trata de crime instantâneo de efeitos permanentes, o início da contagem se dá a partir do primeiro saque, momento em que o delito se consuma. Em que pese a habilitação perante a Administração Militar ter ocorrido há décadas, não há que se falar em prescrição.


 Cabe analisar, ainda, se a certidão de casamento afastaria a ilicitude da habilitação à pensão militar. Ora, o casamento possui um rito formal, detalhado na Lei 6.015, de 31 de dezembro de 1973 – Lei dos Registros Públicos, a saber: Capítulo V (Habilitação para o Casamento, artigos 67-69); Capítulo VI (Do casamento, art. 70); Capítulo VII (Do Registro do Casamento Religioso para Efeitos Civis, artigos 71-75); Capítulo VIII (Do Casamento em Iminente Risco de Vida, art. 76).


Celebrado na forma da lei e, não tendo sido oposto impedimento ou ação de anulação, é de se indagar se o ato celebrado é válido já que a Certidão expedida pelo Cartório é o documento comprobatório do matrimônio. Mas a resposta é negativa porque o ato nulo não se convalida.


Poder-se-ia argumentar, ainda, que em sede de primeiro grau, não ter sido alegada nenhuma questão prejudicial ao processo.  Com efeito, dispõe o art. 123, alínea ‘c’, do Código de Processo Penal Militar que, se a questão prejudicial versar sobre estado civil de pessoa envolvida no processo, o juiz, se reputar a alegação séria e fundada, colherá as provas inadiáveis e, em seguida, suspenderá o processo, até que, no juízo cível, seja a questão prejudicial dirimida por sentença transitada em julgado, sem prejuízo, entretanto, da inquirição de testemunhas e de outras provas que independam da solução no outro juízo. Não resta dúvida que o casamento é uma questão sobre o estado civil de pessoa, e se nenhuma questão prejudicial foi levantada em relação a ele no processo, a certidão de casamento, que é um documento com fé pública deveria ser respeitada. Mas repetimos, em que pese as certidões dos Registros Públicos serem dotadas de fé pública, no caso dos dois julgamentos pelo STM, essa característica não prevaleceu visto que não pode decorrer fé pública de um ato nulo, de um casamento expressamente vedado pela lei.


Em razão disso, não aceitando a validade da certidão de casamento das acusadas, não houve, nas r. Decisões do STM, como se poderia pensar, violação ao art. 19, inciso II, da Carta Magna, segundo o qual é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios recusar fé aos documentos públicos, que pudesse autorizar o recurso extremo[14] porque não existe fé pública em documento originado de um ato nulo vedado expressamente pela lei.

           

À guisa de conclusão


Ressalvado entendimento contrário e de todo respeitado, a conclusão que se chega é que as decisões do E. Superior Tribunal Militar foram acertadas e de acordo com a jurisprudência pacífica em casos semelhantes.


Vale lembrar – e aí serve de desfecho, por cabível à espécie, o voto do Min. Marco Aurélio, ao indeferir o Mandado de Segurança 29.310-BA[15] [referido na sentença de primeiro grau do primeiro caso], impetrado contra acórdão do Tribunal de Contas da União, formalizado em processo por meio do qual foi julgado ilegal ato de concessão de pensão, sendo determinada a cessação do pagamento e a devolução dos valores:


 “O caso é realmente estarrecedor e mostra que não se tem respeito maior pela fidelidade de propósito, respeito maior com a coisa pública. Eis os fatos: juiz classista, aos 72 anos e à beira da morte, tanto assim que veio a falecer 4 meses após o casamento, com câncer terminal na próstata, contraiu – repita-se, aos 72 anos – matrimônio com sobrinha de, à época, 25 anos de idade. A diferença entre eles aproximava-se dos 47 anos.


Concluiu o Tribunal de Contas da União que tudo foi arquitetado visando ter a sobrinha a pensão do falecido. Assentou, em primeiro lugar, que não houve demonstração do atendimento à exigência de autorização judicial para o implemento de casamento de colaterais do terceiro grau. Em segundo lugar, ante a simulação, o vício de consentimento, disse da insubsistência do direito ao benefício. Considerou o contexto e o fez quanto à pensão, ressaltando dados levantados pela Previdência Social a revelarem, em 2010, que a concessão de benefícios a viúvas em situação semelhante, com diferença substancial de idade no casal, alcança R$ 280 milhões.


Evoluo tendo em conta o que serviu de base ao deferimento da tutela de urgência. Faço-o a partir da premissa de que não houve o desfazimento, pelo Órgão de Contas, do casamento, mas simples consideração de quadro fático a implicar a insubsistência da pensão em virtude da má-fé que a cercou.

Não é demasia citar Platão, quanto à verdade: “É preciso tender para a verdade, com toda a alma, com o coração e a inteligência”.


A ementa é a seguinte:


DECADÊNCIA – MÁ-FÉ. Uma vez verificada má-fé, não se tem a incidência do prazo decadencial previsto no artigo 54 da Lei nº 9.784/1999.

PENSÃO – CASAMENTO – FORMAL VERSUS REAL. Surgindo de contexto fático o objetivo de, mediante casamento (tio juiz classista, aos 72 anos, com doença terminal, e sobrinha de 25 anos), alcançar-se, em detrimento do erário, pensão, tem-se a impossibilidade de concluir-se pela existência de direito líquido e certo ao benefício.

VERDADE – PLATÃO. “É preciso tender para a verdade, com toda a alma, com o coração e a inteligência.”



Jorge Cesar de Assis é advogado inscrito na OAB/PR. Membro aposentado do Ministério Público Militar da União. Integrou o Ministério Público paranaense. Oficial da reserva não remunerada da PMPR. Sócio Fundador da Associação Internacional de Justiças Militares-AIJM. Coordenador da Biblioteca de Estudos de Direito Militar da Editora Juruá. Administrador do site: www.jusmilitaris.com.br.


NOTAS


[1] STM, Plenário, Apelação 7000663-31.2023.7.00.0000, relator Min. Marco Antônio de Farias, julgado em sessão virtual de 27 a 29 de maio de 2024. Por maioria, o tribunal julgou improcedente o apelo mantendo a condenação dos réus como incursos no art. 251, caput, do Código Penal Militar

[4] STM, Plenário, Apelação 7000854-76.2023.7.00.0000, relator Min. Artur Vidigal de Oliveira, julgado em sessão virtual de 18 a 21 de março de 2024. Por unanimidade, o tribunal decidiu conhecer do Apelo Ministerial e, por maioria, vencido o relator, decidiu dar provimento para, com a reforma da Sentença de 1º grau, condenar a acusada como incursa no art. 251 do CPM.

[5] CPM, art. 251. Obter, para si ou para outrem, vantagem ilícita, em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil ou qualquer outro meio fraudulento: Pena - reclusão, de dois a sete anos.

[6] A reforma é uma das modalidades da INATIVIDADE dos militares. Vide arts, 3º, ‘b’, II e; 104 e 106 da Lei 6.880, de 1980 – Estatuto dos Militares.

[7] Os impedimentos para o casamento estão previstos no art. 1521 (dentre eles aquele realizado por pessoas que tenham afinidade legal) e, o 1522 informa o momento da oposição.

[9] ASSIS, Jorge Cesar de. Comentários ao Código Penal Militar, 12ª edição, Curitiba: Juruá, 2024, p. 69.

[10] ASSIS, Jorge Cesar de. Comentários ao Código Penal Militar, 12ª edição, p. 643.

[11] CP, art. 171, § 3º - A pena aumenta-se de um terço, se o crime é cometido em detrimento de entidade de direito público ou de instituto de economia popular, assistência social ou beneficência.

[12] CPM, art. 251, § 3º A pena é agravada, se o crime é cometido em detrimento da administração militar.

[13] VELOSO, Roberto Carvalho; ALMEIDA, Dhiego Melo Job de. A NATUREZA DÚPLICE DA CONTAGEM DO PRAZO PRESCRICIONAL NO ESTELIONATO DE RENDAS: UMA PROPOSTA DE COMPATIBILIZAÇÃO DO ENTENDIMENTO DOS TRIBUNAIS SUPERIORES COM AS DIFERENTES TIPOLOGIAS DE FRAUDES PREVIDENCIÁRIA E ASSISTENCIAIS, Revista Pensamento Jurídico – São Paulo – vol. 13, nº 2, jul / dez 2020.  Disponível em https://www.mpsp.mp.br/portal/page/portal/documentacao_e_divulgacao/doc_biblioteca/bibli_servicos_produtos/bibli_informativo/bibli_inf_2006/RPensam-Jur_v.14_n.1.09.pdf 

[14] CF, art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe: (...); II (...); III - julgar, mediante recurso extraordinário, as causas decididas em única ou última instância, quando a decisão recorrida: a) contrariar dispositivo desta Constituição.

[15] STF, 1ª Turma, Mandado de Segurança 29.310 BAHIA, relator Min. Marco Aurélio, julgado em 08.02.2021, por unanimidade foi indeferida a ordem nos termos do voto do Relator.

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